William Mendonça
POESIA, PROSA, MÚSICA E TEATRO
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FUNDAMENTALISMO E DEMOCRACIA
 
   Chega a causar espanto que, em pleno ano de 2013, aconteçam manifestações orquestradas por uma suposta esquerda radical contra a visita ao Brasil da blogueira cubana Yoani Sánches, uma das poucas vozes dissidentes no país de Fidel Castro a conseguir atingir o resto do mundo – e que, por isso mesma, já foi presa, torturada, perseguida de diversas maneiras em seu próprio país.  É um absoluto anacronismo.
   Sob o manto de um suposto “movimento estudantil”, manifestantes raivosos impediram nesta semana a exibição do documentário "Cuba-Honduras", em que aparece a luta de Yoani contra a ditadura que há mais de cinco décadas governa seu país. E ditadura, perdoem os que ainda veem inocência no campo político, é uma coisa ruim – seja ela de esquerda, de direita ou de centro, militar ou civil, caudilhista ou religiosa. 
   Ditadura, por si só, já representa a inexistência de democracia, o cerceamento das liberdades, inclusive a de se manifestar, como fizeram os raivosos estudantes. A própria Yoani, que chegou a ser agredida, não apenas verbalmente, disse preferir o estado democrático onde excessos como essa manifestação acontecem, do que regimes ditatoriais onde quem se opõem é perseguido, preso ou fuzilado. Defendeu seus detratores, mas não deixou de criticar a violência descabida.
   O não entendimento de lições históricas, bem como o patrulhamento ideológico – que vê o universo dividido em “nós contra eles” – são a base de atitudes como essas. É um tipo de fundamentalismo, que se aproxima mais de talibãs e nazistas, pois, como as ditaduras, tenta cercear o pensamento, tenta enquadrar todos em uma mesma moldura, tenta fazer de várias individualidades uma única massa a ser manobrada.
   Tenta, mas, como prova o blog “Generación Y” de Yoani, não consegue. A humanidade é vasta em si mesma, e, se como dizia o filósofo, para existir é preciso pensar, fica claro que todo esforço no sentido do controle do pensamento individual e da padronização política e social vai redundar em fracasso. Foi assim com todas as ditaduras latinoamericanas, tem sido assim com as ditaduras do oriente médio, mais cedo ou mais tarde chegará a vez da China, da Coreia do Norte e (queiram ou não os pró-Fidel) também de Cuba.
   Há quem diga que os homens só trocam uma ditadura por outra, que a democracia é uma falácia, que não há liberdades individuais em lugar nenhum do mundo. O cinismo implícito nesse pensamento se, por um lado, constata que não há regime político perfeito, por outro, não se permite enxergar o óbvio: ninguém quer viver amordaçado ou ser morto por discordar de um governo. Onde esses excessos não acontecem, certamente, é um lugar melhor para se viver. Lembremos a nossa própria ditadura, que não vai tão longe assim.
   Mais preocupante ainda foi a manobra da Embaixada de Cuba em Brasília, que entregou um dossiê sobre a blogueira a aliados políticos em terra brasileira, inclusive a um alto funcionário do governo federal, exatamente para provocar a “desqualificação pública” de Yoani Sánches quando aqui estivesse.  Há quem diga que, assim como na Venezuela de Hugo Chavez, também por aqui os agentes do serviço secreto cubano agem livremente. Teoria da conspiração? Pode ser. Lamentável? Com certeza.

(Publicado no JORNAL ITABORAÍ de 22/02/2013)
 
William Mendonça
Enviado por William Mendonça em 21/02/2013
Alterado em 17/05/2021
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